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segunda-feira, 30 de novembro de 2009

A educação - caminho fundamental para um novo rumo


A educação caminho fundamental para um novo rumo.*

Michele de Oliveira Pereira**




RESUMO

Este artigo trata em três capítulos de um estudo de dois textos, onde são tratadas questões dos problemas gerados pelas especializações, por Geymonat, em segundo momento, da O mito do contexto – Ciência: problemas, objetivos e responsabilidade por Popper, finalizando com uma análise paralela fundamentada nos textos anteriormente citados, das questões da educação pública no Brasil, seus entraves, seus obstáculos, bem como as conseqüências da falta da educação na vida contemporânea. Vem lançar um neologismo em função das observações geradas na práxis da sala de aula. Trata da importância da educação e da necessidade de mudanças emergenciais de uma educação para a manutenção da igualdade e da evolução dos novos tempos e desafios.

Palavras-chaves: educação, compromisso, ciência, problemas, especialização, analfabetos funcionais, alfabéticos funcionais, mudanças.



INTRODUÇÃO

A educação no Brasil hoje bate recordes numéricos, entretanto, ainda há regiões onde são encontrados bolsões de miséria onde a educação para todos ainda é uma grande utopia.
Apesar dos grandes índices de crianças, jovens e adultos matriculados nas escolas públicas e dos incentivos financeiros para a manutenção principalmente das crianças e adolescentes nas escolas, garantindo seu afastamento do trabalho infantil, realidade presente em um passado muito próximo, a educação ainda não se dá a nível satisfatório, de forma que possa garantir uma sociedade igualitária com iguais condições de competição.
Muito há que ser feito para que haja uma mudança efetiva no quadro educacional brasileiro, visto que é só a partir da educação em massa, do compromisso dos docentes, que se dá o crescimento econômico e social de uma nação.
Tal mudança há que ser urgente, visto a crescente economia nacional e os desafios das novas tecnologias. Educação tem que ser para todos, mas não a nível de mais um banco na escola, a nível de aprendizagem satisfatória, que possibilite a todos igualdade de oportunidades.
Este artigo é composto de três capítulos que expõem a problemática da educação pública observada em escolas onde leciono, sob a ótica dos textos analisados. Retratando também problemas afins de outras escolas públicas do Estado do Espírito Santo, bem como políticas públicas de educação.

1 – ANÁLISE DOS TEXTOS E COMENTÁRIOS:

1.1 - O PROBLEMA DA ESPECIALIZAÇÃO – GEYMONAT (1985).

Geymonat (1985), vem em sua obra onde cita Comte, dizer da repartição das ciências, maximizando o potencial de cada sujeito, repartindo por necessidade cada ramo da ciência a fim de otimizar cada potencialidade subjetiva, desta forma demonstrando e explorando os saberes individuais, organizando e subdividindo assim o mundo científico evidenciando seus objetivos, métodos e estruturas. Cada ramificação científica evoluindo a seu tempo e no compasso das ciências geradoras, entretanto, nenhuma ciência é ou está pronta, evolui a cada momento e de acordo com as conquistas tecnológicas e com as necessidades advindas de cada época, fundando-se assim o princípio da especialização em face a delimitação dos campos de pesquisa.
Essa repartição delimitadora favorece a não dispersão do cientista para outros campos, podendo assim cada pesquisador se dedicar a sua área específica de pesquisa e esgotar seu potencial naquele campo particular, sem se preocupar com outros ramos que não o seu, explorar cada problema que surgir a fundo, na intenção de produzir uma sequência lógica de respostas e se organizar com seus pares ou com sua comunidade científica para possíveis soluções que atenda as demandas de um problema social.
Em contrapartida, a ciência tornou-se fechada, e com a instauração das comunidades científicas, deixou de existir uma interligação entre os diversos saberes. Esse fenômeno apesar de todo processo evolutivo da ciência ainda pode ser observado nos dias atuais, faltando aos cientistas interesse e comprometimento com outros campos científicos que não sejam os seus, mesmo que as causas de problemas estejam estritamente relacionados a outros campos de pesquisa, comprometendo com esse isolamento quase egoístico e com o tecnicismo particular a evolução e os destinos da cultura e consequentemente, da civilização.
No fechamento da especialização não se pode vislumbrar um problema em âmbito geral, apenas sob uma ótica restrita, não podendo assim dar cabo a um mal estar social com maior amplidão e rapidez, apenas ao que incomoda uma comunidade específica de pesquisa.
Outro entrave para o melhor aproveitamento das especializações para o bem comum, ou seja para dar conta das demandas sociais é o uso de códigos/ terminologia especializada, tornando os resultados das pesquisas produzidas, de difíceis compreensões e ou até indecifráveis de um campo científico para outro, atrasando com isso o processo evolutivo da ciência, uma vez que gera uma outra pesquisa a fim de entender o que foi proposto por uma teoria anterior de outra especialização mesmo que se co-relacionem.
Para uma clarificação da ciência e até mesmo para sua falsificação, que nada mais é que pôr a prova as teorias existentes, que é o caráter primordial da ciência, segundo Popper, é necessário que os códigos que traduzem resultados de pesquisas sejam acessíveis a todas as comunidades científicas e entendíveis aos que não pertencem a nenhuma dessas comunidades, e é a falsificação que dá vigor a ciência e consequentemente às teorias dela originadas, e uma vez ditada em códigos acessíveis, torna-se necessariamente falsificável ou não uma vez que facilita a sua interpretação – assim se dá o processo de desenvolvimento das ciências.
Diante da prova, toda teoria pode ser falsificada o que não a destitui de ser ciência, e toda teoria tem caráter provisório, o que deixa claro que nenhuma ciência é definitiva, e sim em construção, que se dá diante da observação das novas necessidades que advém da própria evolução humana, e toda teoria falsificada só a é quando da emersão de uma nova teoria que dê conta de falsificar, justificar e substituir a anterior respondendo as questões advindas das suas necessidades geradoras.
Pode-se simplificar esse processo de falsificação como a roda da vida da ciência – cíclica e permanentemente em construção.
A má interpretação dessa construção permanente se dá quando cada especialização se fecha em suas comunidades, uma vez que se perde o sentido de que a ciência apesar de suas ramificações é única e deve atender a um bem comum e social, capaz de transformar o seu tempo. Para tanto, é preciso que as ciências se mesclem, mesmo que ditadas pelas especializações, mas que se façam abertas, comunicáveis e interdisciplinares e que os resultados se misturem, uma vez que só assim haverá clareza e desenvolvimento contínuo, onde a ciência não se desfaz da técnica e assim respectivamente – complementam-se, uma fornecendo problemas, estímulos e novas perspectivas à outra.
Não há como pensar em ciência sem relacioná-la às especializações. Com a subdivisão dos saberes em especializações, as diversas ciências são produzidas por comunidades que se formam a partir das particularidades.
Desta feita, o processo evolutivo das ciências se dá de forma linear, mediante aos problemas que surgem e precisam de respostas para conter um mal estar social.
As comunidades científicas se formam e se fecham em seus campos de pesquisa, caracterizando o processo evolutivo da ciência, entretanto muitas vezes, esse fechamento se dá para que não se disperse o foco da pesquisa, reforçando desta forma as especializações.
Cada campo se fecha a partir do momento em que os problemas são delimitados e tornam-se responsabilidade de grupos específicos de pesquisadores.
Assim, respostas plausíveis, momentâneas e falsificáveis são produzidas para dar conta de problemas específicos de cada campo pesquisado.
Não dispersando o foco da pesquisa, mais claras são as teorias elaboradas, e mais facilmente são postas à prova, e assim podendo ou não ser falsificáveis, e em sendo falsificável, mais facilmente há um retorno à pesquisa a fim de se trabalhar outras teorias que a substituam, dando um caráter contínuo, cíclico e permanente à pesquisa.
Um aspecto negativo da especialização entretanto que não pode ser deixado de lado, é que o fechamento da ciência nas especializações não favorece à produção interdisciplinar, somente beneficiando as pesquisas advindas de problemas específicos à cada área de pesquisa, sem levar em consideração que muitos problemas se co-relacionam e necessitam de soluções interdisciplinares para uma melhor e mais abrangente tentativa de solução.
Fechados em especializações os campos de pesquisas científicas se fecham também em suas terminologias específicas, dificultando desta forma uma comunicação facilitada entre os diversos campos científicos, uma vez que também esta se torna específica, necessitando de nova pesquisa para se entender seus resultados, gerando entraves na falsificação ou validação de teorias, retardando desta forma as aplicações das teorias na solução dos problemas geradores.
Um ponto favorável a especialização se dá quando uma comunidade científica se empenha em resolver um problema específico e produzindo teorias que tentem dar conta do mal social causado por uma demanda. Assim, motivados, os cientistas comprometem-se a buscar soluções para os problemas geradores. A ciência está assim evoluindo há décadas, buscando soluções. Desenvolvendo teorias. Se deparando com novas problemáticas, lançando tais teorias à prova, dando vida a ciência que nunca está ou estará pronta. Esta característica cíclica da ciência movimenta a vontade humana, que nunca pára e se constrói a cada momento. A ciência acompanha a evolução humana e, se faz de acordo com os problemas advindos de tal evolução. O tempo passa e a ciência está pareada. Não há condição de evolução sem que a ciência acompanhe.
Observando pelo aspecto negativo da especialização é importante apontar que enquanto houver uma separação das ciências ditada pelas especializações, a evolução se dá de forma desagregada, onde ramos da ciência evoluem de forma desigual, onde alguns destes tem maior foco e maior crescimento, favorecendo uma evolução desigual sem que hajam estudos em conjunto visando um benefício interdisciplinar em prol do bem comum social, desfavorecendo um crescimento linear, proporcionando picos de crescimento por áreas.
As diversas áreas da ciência para uma evolução e crescimento proporcional precisam trabalhar conjuntamente para que haja um crescimento global da sociedade, inclusive da sociedade científica que tem em comum o compromisso com a evolução da humanidade e com os problemas peculiares desta.

1.2 - O MITO DO CONTEXTO - CIÊNCIA: PROBLEMAS, OBJETIVOS E RESPONSABILIDADE – POPPER (1999).

Segundo Popper (1999), a história do homem pode-se definir como a história do preconceito e do dogma, que ainda hoje são mantidos e combinados com intolerância e fanatismo – muito observado nos movimentos religiosos que e arrastam pelos dias atuais, observável nas guerras movidas por ideologias e por ou por defesas religiosas, onde homens vivem, guerreiam e ainda morrem por seus ideais,
Cita Bacon para elucidar tal fato, profeta da religião secularizada da ciência, quando ousadamente substitui Deus pela natureza, fundando a Ciência da Natureza, onde o poder Divino e seus desígnios eram trocado pelas forças da Natureza e pela seleção natural. O determinismo teológico pela previsibilidade da natureza uma vez que para Bacon a natureza era extremamente previsível, e encontrava-se presente em todas as coisas – das maiores às menores.
À nova ciência cabia a tarefa de determinar a natureza/essência de todas as coisas, para tanto era preciso uma aproximação da natureza com a mente pura, livre de preconceitos, a fim de que assim, ela pudesse se nos revelar. Sua teoria embora ingênua, grandiosa e duradoura, é inacabada, servindo de luz para muitos cientistas e filósofos.
Para Bacon, a ciência nasce da observação, e critica arduamente a impaciência do homem que lhe gera conclusões precipitadas – traduzidas pela antecipação da mente que se faz carregado de preconceitos.
Com a mente purificada, não há espaços para preconceitos, ou elaborações pré estabelecidas, toda observação passa a ser desvinculada de qualquer teoria já conhecida ou interiorizada, assim há uma aproximação com a natureza e uma elaboração teórica pura, sem distorções.
As causas dos erros são as induções, por teorias já existentes. Através da experimentação que se dá a ciência pura.
Entretanto, Popper, teoriza contrariamente a pureza da mente, uma vez que considera ingênua tal teoria, e só é possível considerar uma crença preconceituosa após a evolução da pesquisa científica que nos leva a descartá-la. A libertação do preconceito pode levar-nos a um apego maior ao próprio preconceito e assim a elaboração de uma teoria sintomática, podendo a libertação de idéias, o esvaziamento da mente nos levar a um mente vazia, e não purificada.
Teorias nascem de observações experimentais, portanto, deve ser estruturada e formulada a fim de que possa ser defendida, mas, importante ressaltar que a interpretação baseada em teorias, pode confirmar e fortalecer preconceitos, assim sendo, a produção orna-se comprometida, uma vez que os preconceitos não nos deixam aprender com a experiência, formando uma barreira contra o avanço da ciência por meio da observação e da experiência.
Embuídos de preconceitos, dificilmente teremos uma visão clara do problema a ser observado, e sua interpretação estará fadada à direção de nossas crenças, e portando reforçada.
Ao apoiarmos nossa observação em teorias, esta sempre parecerá ter respostas claras, desvinculando tais observações da observação pura.
Popper entretanto, opina sobre as teorias de Bacon e propõe soluções a problemática gerada por suas teorias: toda teoria empírica deve ter recursos capazes de descrever quaisquer resultados da observação ou experiências para que possa ser refutada ou falsificada. Se, esta tiver apenas observações em concordância, não pode se afirmar que advém de uma teoria empírica – testar uma teoria, é certificar-se de que ela é passível de falhas, não sendo passível de falhas, não se pode testá-la, e assim, dar-lhe credibilidade, importante ressaltar que algumas teorias podem não ter amparo para ser testada de imediato, mas em momento ulterior – reforçando assim que toda teoria deve passar pelos critérios do teste, da falsificação e da refutação.
Outra alternativa proposta por Popper, é que ao se testar uma teoria anteriormente concebida e apoiando-se nela, as observações ou experiências advindas sejam testes a teoria geradora, na busca de falhas, de pontos fracos, mesmo que baseada em outras teorias concorrentes.
Toda teoria precisa ter condições de ser testada, e criticada., não podendo ser conclusiva antes disso, uma vez que está cercada de possibilidades inclusive de erros, assim sendo ocorre o processo de seleção das teorias, onde as mais fracas e menos consistentes acabam por ser descartadas, embora até mesmo as teorias mais estruturadas e fundamentadas também sejam passíveis de serem derrubadas e substituídas, dando-nos a certeza de que nunca poderemos prever qual parte da ciência será revista a seguir, uma vez que a ciência precisa atender a seu tempo e problemas de ordem prática ou teórica, e só se faz ciência quando se ousa errar, uma vez que é com os erros e com a análise detalhada destes, que se aprende, ou se toma novos rumos de pesquisa.
Não podendo de deixar de citar que a ciência nasce de teorias, de preconceitos, superstições, mitos e geradas por estes não se confirmam – que ocorrem de maneira inconsciente, tornando-se conscientes quando nos damos conta de que não aconteceram – que se dá a nível pré-científico.
Importante ressaltar, que ao nos lançarmos em uma pesquisa, quase sempre partimos por problemas que causam incômodos, e dificilmente por observações, uma vez que são os problemas que geram frustração às nossas expectativas.
Outro fator importante a ser citados é que perante um problema, advindos de nossas expectativas frustradas, prosseguimos com tentativas: tentamos adivinhar soluções para tais problemas, que podem argumentar nossas críticas e testes, que por sua vez podem ser refutados, ou não resolver nossos problemas como um todo, e muitas vezes as soluções que resolvem parte do problema logo dão margem a outros problemas e nos deparamos com uma realidade – quanto mais perto da solução, mais e novos problemas temos gerados por nossas expectativas, assim sendo, quanto mais sabemos, mais observadores e críticos nos tornamos, entretanto, a observação não é sempre anterior ao problema, mas surge a partir dele e para dar conta dele, e pode ser favorável ou contrária a uma opinião qualquer.
Quando nos deparamos com um problema, de ordem prática ou teórica, não sabemos muito a seu respeito, e o primeiro passo é a tentativa de o solucionarmos, só assim poderemos começar a compreendê-lo, partindo de soluções menos elaboradas, que dispensem menos trabalho, e que gerem erros, que são os geradores da sua compreensão, porém não dão cabo do problema para soluções mais elaboradas que requerem muito trabalho e que começam a nos clarear o caminho a seguir para solucioná-lo.
Não há solução de um problema sem que este seja minuciosamente trabalhado e subdividido, de modo que se possa ver claramente todas as suas ramificações e interligações – podendo neste ponto ser submetidas às críticas de outrem.
E, é inegável que muito se aprende com as tentativas fracassadas de solucionar um problema e, quanto mais trabalhamos um problema, mais familiarizados com este ficamos e mais compreensíveis às suas dificuldades e mais capacitado para modelar e reformular este problema tem o cientista, estando assim cada vez mais próximo de solucioná-lo.
O nosso não saber é incomensurável, e, quanto mais adquirimos conhecimentos, menos sabemos, e a busca de conhecimento é parte do desconforto causado por esse não saber, nos lançando numa busca incessante pelo saber, gerando mudanças cognitivas na busca da solução dos problemas que frustram nossas expectativas, nos lançando a compreender teorias.
Em suma, fazer ciência, é aceitar que os problemas são multiplicáveis a medida que buscamos suas soluções, e as teorias a cerca destes são criticáveis, e que estamos fadados ao erro sempre e que crescemos a medida que erramos, e isso é uma roda que dá e dará sempre vida a ciência, uma vez que os problemas nunca cessarão, e por mais que soluções sejam encontradas, no próximo momento esta que antes daria conta de amenizar as expectativas, já não mais conseguem conter a temporalidade das soluções.
Diante do exposto, o cientista tem uma função e um compromisso social, sem julgar-se diante de suas tentativas e erros, mas assumir-se como aprendiz com estes, buscando soluções para problemas que causam mal estares sociais, sem nunca se envaidecer com suas teorias, visando uma colaboração com o bem comum, libertando-se de dogmas e preconceitos em prol da evolução científica, indo de encontro com seus ideais, sem destes querer tirar vantagens em benefício próprio apenas, mas libertando-se da ignorância pelo conhecimento; é especializar-se, mas não manter-se trancado nesta, que não promove a auto-libertação e pouco contribui para evolução da ciência e em conseqüência disso da humanidade, que torna-se liberta com a colaboração da ciência fortalecendo os ideais democráticos e de abertura social.

2 - EDUCAÇÃO: A ÚNICA PORTA POSSIVEL PARA A IGUALDADE SOCIAL.


Venho expor através desta análise crítica ante os textos analisados, minha indignação despertada pela observação crítica quanto à educação nacional.
Em meio a uma crescente economia, um processo de seleção que se dá mediante ao grau de educação, e apenas aos mais graduados oportuniza condições melhores de trabalho e em conseqüência disso, de vida, venho sugerir um neologismo: ALFABÉTICOS FUNCIONAIS.
Enquanto se escuta muito o termo ANALFABETOS FUNCIONAIS, venho mostrar minha preocupação com os rumos da educação, explicando o uso deste termo.
Os analfabetos funcionais são aqueles que não mais freqüentam as escolas, sabem ler e escrever básica e precariamente - uma educação de subsistência; aliás, essa educação precária serve muitas vezes apenas para não usar a impressão digital em momentos em que a assinatura é necessária. Duras palavras, mas também é dura a realidade de pessoas que não tiveram a oportunidade da alfabetização de qualidade, realidade que os põe no submundo dos analfabetos que assim os qualifica e assim os condena.
Cito o termo ALFABÉTICOS FUNCIONAIS, quando me refiro às crianças, adolescentes, jovens e adultos que estão nas escolas e recebem uma educação de péssima qualidade.
É preocupante ver crianças e adolescentes no 2º ciclo do ensino fundamental, mais precisamente do 6º ao 9º ano, que mal sabem o que escrevem, não lêem e quando o fazem, muito mal, não interpretam, não tem conexão de idéias, não externam seus pensamentos através de textos, e não produzem nada ou quase nada em sala de aula.
É preocupante ver crianças saindo do 5º ano e entrando no 6º ano sem saber ler o que escrevem em seus cadernos, sem saber as quatro operações, sem saber escrever autonomamente seus nomes, sem carregá-los em erros toscos de português.
Mais preocupante ainda é encontrar em sala de aula, alunos no 3º ano do ensino médio cometendo os mesmos erros toscos, e com as mesmas dificuldades e limitações.
Se o processo de alfabetização se dá também no 2º ciclo do ensino fundamental, porque esses adolescentes ainda trazem consigo a mesma defasagem quando entram no ensino médio?
Um dos grandes problemas da educação, é a especialização. O professor dono da cadeira, dono da disciplina, que não proporciona atividades diversificadas em sala de aula, e que não se permite diante disso ser dono da alfabetização, que é o grande foco da educação, uma vez que é grande o número de alunos em processo de alfabetização que ainda não estão alfabetizados; não amadurecidos e preparados para enfrentar os conteúdos da série em que estão.
Desta feita, a especialização torna-se inimiga da educação de qualidade uma vez que a alfabetização não é e não pode ser responsabilidade apenas da língua portuguesa, o que delega a função de alfabetizar também aos professores das outras disciplinas componentes do currículo escolar.
Reforçando esta observação, cito novamente Geymonet (1985, p. 53):

[...]mas como poderá surgir uma nova cultura, adequada à nossa época, se os cientistas, fechados no seu especialismo, continuarão a recusar assumir um vínculo sério com os problemas gerais?[...]

Diante da ameaça do analfabetismo funcional, todo corpo docente deve se responsabilizar pela alfabetização, ora um aluno que apenas copia estará fadado a não calcular, a não interpretar e enfrentará inúmeras dificuldades em sua vida escolar, e encontrando precocemente o caminho da evasão escolar.
Assim incorremos novamente na educação bancária, onde o aluno é receptor de conhecimentos que ele não tem capacidade para apreender. Dessa forma, cada professor na sua disciplina, muito pouco contribui para uma educação de excelência.
É hora de dar um basta na especialização e mudar de vez os paradigmas uma vez que segundo Popper (1999, p. 139):

[...] um cientista que não tenha interesse ardente pelos outros campos da ciência exclui-se da participação nessa autolibertação do conhecimento através conhecimento, que é tarefa cultural da ciência[...]

Professor é alfabetizador sim, ainda que esteja lecionando no ensino médio que não é mais tido como processo de alfabetização. Essa observação surge dos erros cometidos por anos a fio, e pela repetição destes erros ainda nos tempos atuais nas salas de aula.
Assim, cito Popper (1999, p.118) para reforçar minha observação:

[...] pode resumir-se a opinião aqui apresentada, ao afirmar que a função decisiva da observação e da experiência em ciência é a crítica. A observação e a experiência nada podem estabelecer de modo conclusivo, pois sempre existe a possibilidade de um erro sistemático através da interpretação errada sistemática de um ou outro facto. Mas a observação e a experiência desempenham, sem dúvida um papel importante na discussão crítica das teorias científicas. Essencialmente, ajudam-nos a eliminar as teorias mais fracas[...]

Inúmeros são os fatores da falência educacional podendo-se citar o fato de que as famílias estão ausentes do processo educacional de seus filhos, responsabilizando a escola por todo esse processo, que se dá desacompanhado, desamparado.
Com os novos tempos, com as novas necessidades, a função da maternagem que era função da mãe ou da figura familiar feminina, muitas vezes não acontece mais, e as crianças ao chegarem às escolas não mais chegam carregadas de afeto positivo, mas de afeto que afetam. As famílias assumem moldes cada vez mais diferenciados, e essas crianças precisam dar conta de problemas que muitas vezes não são seus.
Posso qualificar isso como desamparo parental. Muitas vezes que não se dá voluntariamente, mas por vezes, necessariamente. Diante dessa nova realidade as crianças desde muito cedo precisam criar estratégias de autonomia, visto a garantir sua sobrevivência, e são carregadas de responsabilidades, defesas, e até de ingenuidade.
Diante da necessidade de dar muitas vezes o amparo parental, a escola se vê diante de um grande conflito, suprir essa carência, e cumprir o vasto currículo, e no confronto dessas duas realidades se dá a indisciplina em sala de aula acompanhada de baixa aprendizagem.
Voltando os olhares de forma crítica, sensível e observadores, pode-se traduzir a indisciplina muitas vezes como a necessidade de resgatar afetos perdidos no sítio familiar, mesmo que seja em forma de correção, de limites, uma vez que todos nós temos por questões até de instinto de sobrevivência a necessidade de limitar nossos atos, e quando não o podemos fazer autonomamente, que seja imposto por terceiros.
É papel da escola impor limites, quando esses ainda fazem parte do cotidiano de alguns educandos, mas também de oportunizar crescimento cognitivo.
De nada adianta limite, sem a oportunização de educação de qualidade que garanta a autonomia, uma educação que se aproxime das necessidades educacionais de sua clientela. É preciso estar atentos ao fato de que as necessidades de hoje são outras, e que o professor não pode mais ser autor de uma educação unilateral, precisa por sua vez oportunizar as descobertas em sala de aula, e não mais vir cheio de teorias prontas, acabadas, inflexíveis, que não mais formam alunos imaginativos, capazes de interpretar problemas, estruturar pensamentos e testar fórmulas, precisa se enxergar como ator aprendente na sala de aula, não mais como detentor do saber.

[...] contra essa indolência intelectual que nos retira aos poucos o senso da novidade espiritual, o ensino das descobertas ao longo da história científica pode ser de grande ajuda. Para ensinar um aluno a inventar, é bom mostrar-lhe que ele pode descobrir. É preciso também inquietar a razão e desfazer os hábitos do conhecimento objetivo[...] (BACHELARD, 1996, p. 303;304).

Sem esta, estaremos formando uma massa de limitados.
As escolas e seu corpo docente, precisam redescobrir e redefinir os moldes da educação de modo a proporcionar uma aproximação íntima com a realidade das famílias que ali serão atendidas por meio da educação oferecida.
E, é preocupante a realidade escolar pública em nosso país, podendo concluir que quando ainda hoje professores se põem na posição de detentores do saber e da disciplina, alunos ainda chegam a tão alto nível de escolarização sem conhecimentos básicos muito anteriores a série em que estão.
E, assim será por longos anos se a educação ainda se pautar em números, em estatísticas, que condizem muito pouco com a realidade de fato.
Ainda citando Popper (1999, p. 129;130), venho complementar:

[...] a nossa ignorância não tem limites e é esmagadora. Cada porção de conhecimentos que adquirimos serve para abrirmos mais os olhos para a vastidão da nossa ignorância.[...] A tensão entre o nosso conhecimento é decisiva para o aumento cognitivo. Inspira o avanço do conhecimento e determina as suas fronteiras sempre em mudança.[...] um problema surge, cresce e torna-se importante graças aos nossos fracassos na sua solução.[...]

A educação hoje deveria estar pautada em boas práticas educacionais do século passado que foram abandonadas, quando os alunos que não adquiriam os conhecimentos das séries que estavam seguramente não avançariam para a série seguinte e ali no seu tempo de amadurecimento correto, resgataria esses conhecimentos, prosseguindo apenas quando sua dificuldade fosse resgatada. Onde o professor era mal remunerado, mas em contrapartida ainda era a autoridade da sala de aula, sem precisar usar de autoritarismo. O conhecimento, a aprendizagem realmente acontecia, e os currículos eram enormemente mais pesados, com disciplinas que hoje não mais aparecem nos currículos escolares. Infelizmente, a escola não era para todos, como hoje é, mas os que ali podiam estar, de fato aprendiam, mais disciplinas e com uma aprendizagem duradoura, não superficial.
Penso que muitas teorias foram mal interpretadas, e fadas ao esquecimento, ou ganharam roupagens inadequadas, desvalorizando com isso a construção do conhecimento.
Desconstruíram boas teorias, teorias que deram certo por longos anos, ou deixaram de observar pontos importantes dessas teorias que deveriam estar adaptados as novas teorias.

[...] não podemos derrubar uma boa teoria sem aprender uma imensidade de coisas com ela e com o seu fracasso. Como sempre aprendemos com nossos erros. O derrube de uma teoria causa sempre problemas novos[...] ( POPPER, 1999, p. 133).

É certo que as teorias só se reconstroem através dos erros, e os problemas só aparecem com a observação, mas já é chegada a hora de procurar novas teorias que busquem solucionar o problema da educação pública brasileira, não mais se pode apenas observar sem promover mudanças, uma vez que o problema que se instaurou é ainda muito maior do que o que se tinha no século passado.
As exigências são outras, as necessidades também, estamos cercados por altas tecnologias que se apresentam de forma muito mais sedutora e interessantes que as salas de aulas, que os componentes curriculares, que os livros didáticos, que professores retrógrados e individualistas, e, portanto, a educação precisa ser outra, pautadas em boas e velhas teorias, adaptadas aos novos tempos, às novas tecnologias, uma vez que o abandono de bases sólidas gerou-se um problema no campo teórico e no prático.
Ainda há muito a ser explorado em nossas crianças em fase de alfabetização, e muitos resultados podem ser obtidos. A educação é um problema a ser estudado, não há moldes perfeitos, nem tão pouco inacabados. A educação é um problema solucionável, em construção constante, e muitos são os agentes dessa construção.

[...] o ponto que quero afirmar é que, embora continuemos a fracassar, na solução do nosso problema, teremos aprendido muito na nossa luta com ele. Quanto mais tentamos, tanto mais aprendemos a seu respeito – mesmo que falhemos sempre. É claro que, tendo-nos deste modo familiarizados com o problema – ou seja, com as suas dificuldades – temos uma melhor hipótese de o resolver do que alguém que nem sequer compreende as dificuldades[...] (POPPER, 1999, pg.128-129)

Importante ainda, se faz apontar outro problema na educação: os gestores educacionais precisam ser educadores, precisam ter enfrentado uma sala de aula por anos e não por dias ou meses, precisam ter consolidado suas teorias na vivência como docente, precisam conhecer os problemas reais que as escolas enfrentam em suas rotinas, precisam conhecer de perto a luta da classe, suas dificuldades enquanto professores para direcionarem suas práticas de gestão, podendo assim beneficiar um todo, não apenas os interesses públicos. Um administrador não terá uma visão da educação que tem um professor, mesmo que um professor tenha noções de administração que lhe possibilite em outro estágio administrar e gerir uma escola com a mesma maestria que um bom administrador. Mas práticas administrativas não são práticas educacionais. Um advogado por mais que se especialize, por mais que conheça de leis e do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescentes) jamais conhecerá a prática docente, por mais que se lembre de seus longos anos de estudante e de suas dificuldades enquanto ator desse processo. Quem conhece a realidade da educação é o professor, e cabe a ele reconstruir a educação.
A educação não pode mais se deparar com ideologias, uma vez que não há uma fórmula certa como em cálculos matemáticos para solucionar o problema instalado.
Avaliando esse emaranhado complexo de falhas na educação, o pensamento de Popper (1999, p. 129) respalda:

[...] “trabalhar um problema” criticamente: de conhecê-los, de nos aproximarmos e familiarizarmos verdadeiramente com ele, e assim talvez aumentar as nossas possibilidades de encontrar um dia, uma solução satisfatória e ilustrada. [...] Que é compreender um problema? [...] É tentar resolvê-lo e falhar. Só começamos a compreender o nosso problema se verificarmos que uma solução óbvia não o resolve. Porque um problema é uma dificuldade. E tal apenas se pode fazer descobrindo que não existe uma solução fácil e óbvia para ele. Assim, apenas nos familiarizamos com um problema, após inúmeras tentativas goradas para o resolver. E, após uma longa série de fracasso – de tentativas que nos oferecem soluções que se revelam aceitáveis – podemos até tornar-nos especialistas neste problema particular.[...]


Tal solução também não pode se prender a discursos fabulosos, currículos implementados, palavras difíceis que confundem a capacidade crítica do cidadão comum e a torna um código indecifrável. O problema da falência da educação é de ordem social e atinge principalmente as classes menos favorecidas. E, muitas vezes uma pergunta insiste em se repetir: Não será estratégia governamental manter a educação no patamar em que se encontra? Ou são os governantes também analfabetos funcionais? Que só conseguem ler que de fato é importante para eles? E não enxergam nas entrelinhas o problema que grita por anos?
Os alfabéticos funcionais de hoje serão os analfabetos funcionais de amanhã e essa realidade não pode perdurar.
A educação precisa se dar democraticamente e ultrapassar as fronteiras impostas pelos muros da escola, precisa ser uma vontade social, e, garantir uma sociedade aberta :

[...] Uma sociedade aberta, (isto é, uma sociedade baseada na idéia de respeito pelas opiniões dissidentes e não pela sua simples tolerância) e uma democracia (isto é, uma forma de governo dedicada à protecção de uma sociedade aberta) não podem florescer se a ciência se tornar posse exclusiva de um conjunto fechado de especialistas. Acredito que o hábito de expor sempre o nosso problema, com a maior clareza possível muito contribuirá para auxiliar a importante tarefa de tornar a ciência – quer dizer, as idéias científicas – melhor e mais amplamente entendida [...] (POPPER, 1999,p. 140).

CONCLUSÃO.

Não basta com os desafios do mudo atual ter escolas suntuosas, ter vagas para todos aqueles que queiram, incluir de qualquer maneira, sem que se tenha total aparato para abarcar a inclusão de forma satisfatória e com qualidade para quem é incluído, é preciso que haja uma educação verdadeira, formadora e geradora de uma massa autônoma, pensante, capaz de promover mudanças.
É preciso que os números falem, mas falem verdadeiramente, falem a nível de igualdade, a nível de criticidade.
A educação é a única porta possível para a igualdade social, é a única garantia de uma sociedade desenvolvida, é a única a formar cidadãos autônomos e competitivos, capazes de promover mudanças pessoais e sociais.
A educação é a única forma de se implantar sonhos, e realizá-los, é a única forma de mudar em larga escala. É a única forma de se promover justiça social.
Muito ainda há por ser feito, o caminho ainda está começando a ser percorrido, mas para que a educação seja de qualidade e para todos verdadeiramente, é necessário que muitos paradigmas sejam mudados. É preciso uma tomada de consciência de forma global. É preciso que as pessoas queiram abraçar essa mudança e sejam autores de seus direito. Autores de fato, que ajam em benefício próprio e coletivo.
A educação deve ser sonhada por todos, e principalmente vivenciada como a única oportunidade de mudança real.
Educar é uma responsabilidade de pais, professores, gestores, governantes e legisladores, e não basta que toda a teoria e legislação que a amparam e garantem-na, sejam bonitas no papel, precisam funcionar, precisam ser verdadeira, precisam acontecer e muito mais, precisam provocar e promover mudanças.
É só e somente só através da educação que se atinge a igualdade de oportunidades e de valores.
Não se faz educação só, uma vez que a educação é um processo, não é, e não pode ser unilateral, precisa ser uma luta armada travada por todos, mas, armada de letras, de sílabas, de palavras, verbetes, conjugações, plurais, números e múltiplos, boas histórias, localizações certas, fórmulas, cálculos, pois precisa ser multiplicada, pois só assim o produto dessa luta será comemorado com sonhos e consequentemente com progresso para a nação e para todos aqueles que dela se armarem.
Educar é possível, mudar é necessário e urgente.